Sobre ser
identidade digital - prolongamento da personalidade pessoal ou campo alternativo da nossa personalidade íntima?
Compartilhamos as seguintes impressões:
Segundo o pensar da colega Cecília "a identidade de cada um é aquilo que faz de nós aquilo que somos, isto é, é aquilo que nos define como seres humanos, mais propriamente como pessoas. Assim sendo a nossa identidade pública é manifestação daquilo que, efectivamente somos. Mas... será que é mesmo assim? será que mesmo publicamente não poderemos mostrar ser algo e depois não o sermos, realmente? Ora, é verdade que isto poderá acontecer: assumir uma personalidade do qual não se é detentor, mas... neste caso será mais fácil de detectar? Talvez. Podemos mentir às pessoas e fazer-nos passar por aquilo que não somos, mas no domínio das relações pessoais e sociais não sei se isso poderá acontecer sempre. A este fenómeno - fazer-nos passar por aquilo que não somos - chama-se má-fé e opacidade pessoal levando-nos, em termos sociais, a sermos vistos como pessoas menos boas (em termos éticos) ou com uma conotação negativa (nomeadamente como cínicos em termos de senso-comum). Será que isto também acontece no domínio da virtualidade? será que com maior, menor ou igual incidência? É uma questão de ética pessoal, responderia. Contudo tenho de confessar que no domínio da técnica e da virtualidade será mais fácil criar uma identidade diferente (como se estivessemos num constante role-play) do que na vida real. Mas quais as razões que o permitem? A falta de presencialidade, diria; a falta do rosto (como manifestação de relação ética - afirma Lévinas -). Efectivamente a falta de presencialidade, de rosto humano poderá levar-nos a criar uma identidade falsa ou múltiplas identidades contudo, e como disse no início, depende da ética de cada um e, dependerá acima de tudo da intenção com que se praticar tal acção (posso criar uma identidade falsa para, por exemplo apanhar um criminoso ou posso criar uma identidade falsa para cometer um crime). O problema da intenção, parece-me, é um problema central na resposta a esta questão, contudo existem outras questões que estão subjacentes e que são, efectivamente, também importantes tais como a presencialidade (ou falta dela).
O Antônio Pedro percebe que "a identidade de cada um é aquilo que imaginamos que os outros vêm em nós.Que a criação de uma identidade digital será pois o prolongamento da nossa personalidade, na medida em que estamos a tentar levar ao outro aquilo que imaginamos que ele quer saber de nós. Mas não o faremos de forma inocente, pois acredito que os pontos que pensamos ser negativos sejam apagados ou "limados" no nosso perfil.
Cecília concorda que "a identidade pessoal é aquilo que os outros vêem em nós. Do p.v. da psicologia a construção da identidade parte de várias perspectivas: aquilo que nós vemos em nós; aquilo que pensamos sobre nós; aquilo que os outros vêem em nós (que ajudam na formação do auto - conceito) e , mais... aquilo que queremos que os outros vejam em nós e o que nós queremos ver em nós mesmos. Portanto o processo de identidade é uma criação com diversos níveis que vai desde aquilo que somos (que obviamente implica a tal construção social) até aquilo que queremos ser (projectando em nós algo que não somos). A construção da identidade pessoal é, em termos de análise psicológica, uma construção bastante complexa que coloca, para além disto, em jogo a interacção entre a hereditariede e o meio.
Para o Marco "na vida real, nem sempre queremos mostrar quem autenticamente somos e que, por isso, pode ser fácil transpor para o ambiente virtual essa “falsidade” do Eu.
Lembrando-nos de Castells, graças à Internet e às TIC, vivemos actualmente uma era da informação e do conhecimento. A sociedade caracteriza-se por uma nova forma de comunicação que valoriza a informação, alterando desse modo a estrutura vigente. A informação flui a velocidades e em quantidades antes inimagináveis. Verifica-se também que as pessoas têm uma nova tendência para se reunirem em grupos sociais online a fim de partilharem interesses comuns.
Talvez este novo ambiente tenha fomentado junto desses utilizadores da Internet uma vontade de criar uma nova identidade – adequar a sua personalidade a um mundo desconhecido mas muito exigente a vários níveis - para marcar um lugar e fazer-se, assim, reconhecer como diferente entre tantos outros. Será que a necessidade de criar identidades diferentes (digitais) ameaça a estabilidade da sociedade “tradicional”? Como as referências se alteraram, obediência a elas é a palavra de ordem para se sobreviver nesta nova era tecnológica?
Embora não tenha as referências tradicionais, o indivíduo continua a precisar de relacionar-se com pessoas, partilhar experiências e conhecimentos com os outros, mesmo em ambiente virtual. Nos últimos tempos, essas relações constroem-se, a grande velocidade, através das redes mundiais de computadores que aproximam os indivíduos e possibilitam o surgimento de novas formas de relações sociais: as comunidades virtuais. Vivemos, inevitavelmente, uma realidade diferente, na qual as barreiras espaciais, temporais e geográficas já não são tão significativas.
A Cecília retoma que a má fé é caracterizada pela sua intencionalidade, ou seja, é uma acção incorrecta do p.v.ético - moral que se pratica sabendo as consequências que daí provêm. Quando falava desta actitude referia-me ao facto de que por vezes, na vida, intencionalmente age-se de má fé (sei lá, por exemplo, não disse a um colega meu o que saía no teste para eu tirar melhor nota), mas... provavelmente será mais fácil agir de má fé no domínio online porque, enquanto na vida (presencial) há sempre alguém que, mais cedo ou mais tarde, descobre a má fé dessa acção, o mesmo levará mais tempo a acontecer no regime online. Não é à toa que muito se fala das redes de pedofilia online; efectivamente e de forma intencional há alguém que se faz passar por alguém mais novo para entrar em conversas com um jovem, marcar um encontro.... ou outras coisas. Por isso não sei se a questão da má fé e desta (má) intencionalidade não serão mais facilitadas online. E, neste sentido,ela questiona - será então que prolongamos a nossa identidade ou complementamos a mesma com outra digital', segundo ela - seria uma forma mais permissiva ou menos controlada (por isso se fala da segurança na internet).
O AntônioPedro pergunta - Seremos nós avatares de nós próprios?E responde...
Aquilo que pensamos sobre nós nem sempre corresponde aquilo que realmente somos.
Podemos estar a ser verdadeiros ao criar a nossa identidade digital e escrever algo que já não corresponde à realidade.Várias vezes somos confrontados com a nossa imagem ou com a nossa voz e não as reconhecemos.Baudrillard tem umas ideias sobre isto...
Ao tentar pensar sobre mim próprio estou a criar um simulacro sobre aquilo que realmente sou. A minha identidade digital, por mais transparente que eu queira, estará sempre sujeita à noção que tenho do eu.Eu sou um avatar de mim próprio na medida em que transponho para mim aquilo que penso de mim. A nossa identidade digital pode ser um campo alternativo da nossa personalidade íntima no caso de ficarmos preocupados com aquilo que pensamos que os outros pensam de nós se acharmos que não corresponde ao que vemos em nós".
Percebo um movimento ora pela assunção de um, ora de outro, mas sobretudo a existência do duplo, o sujeito em articulações e possibilidades de simulação, o sujeito transitando no limiar,entre o que é e o que pode se tornar, sem a garantia de permanência, sem estar fechado em sí,pois o desejo de, a cada nova tentativa, acessar um plano com novas potencialidades. E, nesse sentido, a fragilidade do sujeito pode revelar-se na força e conjunto de suas sutilezas.
Para o colega Marco "a visão sobre o avatar,exemplificado pelo Antônio -(que Outro(s) há em nós?) e o modo como o Antônio expõe as ideias sobre a nossa identidade contrariam a tese que defende haver uma vontade geral de sermos diferentes quando convivemos com os outros através das novas tecnologias, estar conectados virtualmente. (...)parece que o avatar (figura muito recente no ambiente online) é uma forma se sermos anónimos no mundo virtual."
Mas não percebi bem se o avatar existe em nós,ou se o criamos propositadamente para existirmos no ambiente online. Penso que ninguém está interessado em forjar novos aspectos sobre a sua intimidade para existir diferentemente online, sendo antes a criação do tal simulacro Baudrillardiano um fenómeno natural.
Percebe como algo natural, mas cosntitui-se num dilema inultrapassável de descobrir quem verdadeiramente somos e não impede que a identidade digital seja construída em proximidade com a identidade "real" ("aquilo que penso de mim").
Antônio trouxe a ideia que "o avatar independente do conceito da Internet", estava a pensar na forma como comandamos o nosso corpo, as nossas vontades e o nosso discurso, para estarem de acordo com aquilo que idealizamos (um pouco como fazemos quando criamos e comandamos um avatar no ciberespaço).
Se o fazemos dia a dia com o nosso eu físico mais facilmente o fazemos com o nosso eu virtual.
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